Comer muito rápido faz mal à saúde da criança? Fonoaudióloga responde algumas perguntas e explica os riscos. Hábito deve ser observado pelos pais e acompanhado por especialistas de diferentes áreas
Você conhece alguma criança que come rápido demais ou não aceita muito bem os alimentos na hora de comer? Apesar de parecer serem problemas diferentes, eles podem ter a mesma causa: dificuldade de mastigação. Para falar sobre este tema tão importante e explicar direitinho as consequências desse hábito, a fonoaudióloga Carla Deliberato responde várias dúvidas que as famílias com crianças pequenas têm diante deste assunto.
Consumir qualquer alimento sem a mastigação adequada pode fazer com que a criança desenvolva diversos problemas de saúde. É o que alerta a fonoaudióloga Carla Deliberato: “Comer rápido demais pode trazer algumas consequências no sentido da criança se engasgar e poder vir a óbito, porque dependendo com o que ela se engasga são minutos para conseguir desengasgar. Outra consequência é que ela pode desenvolver problemas digestivos, quando a gente se alimenta de maneira muito rápida o bolo alimentar não é preparado adequadamente, então ele chega no estômago de uma maneira que não é o ideal, tornando a criança suscetível a outras questões digestivas.“
Existem estudos que apontam que comer rápido faz mal e pode causar a síndrome metabólica. De acordo com dados divulgados pela Fiocruz em março de 2022, após um encontro com as especialistas do IFF/Fiocruz, a síndrome metabólica na infância e na adolescência teve aumento na sua prevalência devido ao aumento da obesidade nessa faixa etária, o que aumenta também, os riscos de Doenças Cardiovasculares e Diabetes na vida adulta.
É preciso lembrar que a Síndrome Metabólica não é uma doença e sim um conjunto de fatores de risco metabólicos individuais. E uma das principais causas é a dieta inadequada. Existem pesquisas que apontam que as chances de desenvolver a síndrome metabólica são de 11,6% para aqueles que comem em ritmo mais acelerado. Além disso, o fato de comer rápido também pode estar associado ao aumento de peso, causando a obesidade infantil.
Por isso, é importante ter atenção aos hábitos alimentares das nossas crianças, e se atentar ao ritmo em que elas comem suas refeições. Implementar uma rotina alimentar saudável na sua casa, e monitorar a velocidade da mastigação são imprescindíveis. Carla explica que o hábito de comer rápido pode estar relacionado às questões emocionais ou até o convívio com os pais “se partirmos do pressuposto que a alimentação faz parte de um ato aprendido, se eu aprendo que eu tenho que comer vendo televisão, e comer depressa, se eu não reservo um tempo adequado para fazer minha refeição, eu vou achar como criança, que aquilo é o normal e vou seguir um padrão que me foi apresentado. Então, tudo que se relaciona ao hábito alimentar de uma família diante das refeições vai interferir diretamente no envolvimento da criança com a comida.”
Outro problema de uma alimentação inadequada é quando a criança se alimenta rápido, ela não interage com o alimento e acaba não aproveitando as características que ele proporciona na boca. Segundo a especialista, ela praticamente não sente e apenas engole. Isso não estimula o paladar infantil.
A criança que come rápido demais tende a não mastigar como deveria, ela amassa o alimento, não processado corretamente para conseguir engolir, o que pode levar a um engasgo. Os riscos são ainda maiores para uma aspiração, se ela estiver comendo rápido demais, muito afoita, brincando ou até mesmo distraída. Carla também aponta que uma das causas dessa “pressa para comer” é “às vezes a criança quer engolir rápido para não ter o desprazer com um sabor não agradável.” Mas, atenção aos papais e tutores, o certo é desfrutar do sabor do alimento e do prazer que ele proporciona, além claro do valor nutricional. Esse processo não pode ser rápido demais para que seja possível abstrair essas informações.”
A fonoaudióloga Carla revela que uma queixa comum entre os pais é que a criança “põe na boca o alimento e ele desaparece, ela engole de uma vez. Isso acontece porque ela não processa nada e engole o alimento inteiro. Neste caso, a criança está demonstrando que pode não saber mastigar ou que está fazendo isso minimamente.”
“Outras famílias falam que a criança não consegue evoluir na textura, só come alimentos moles, como um purê e aí quando dá um alimento mais sólido não consegue comer. Mas porque? porque não mastiga”.
Mas, então o que deve se observar neste processo de alimentação? Carla dá algumas dicas importantes “no processo de mastigação a criança tem que pegar o alimento, morder com os dentes da frente , lateralizar o alimento com a língua, que deve ir para um lado e para outro na boca em movimentos mastigatórios chamados movimentos de rotação. Quando a criança faz o movimento parecendo com um “coelhinho”, são movimentos verticalizados e isso pode ser um indício de que ela não está mastigando de maneira efetiva, ou quando a criança faz um bico muito grande e até parece que está mastigando, mas na verdade está só amassando o alimento com as gengivas ou contra o céu da boca e ,como ela não mastiga , ela faz esse esforço compensatório com os lábios.”
É preciso prestar atenção em alguns sinais, como no processo de mastigação a criança tem que conseguir quebrar uma torrada, ou uma bolacha com o uso dos dentes da frente e levar o alimento para a lateral da boca. “Crianças que não conseguem comer alimentos inteiros, só aceitam se estiverem cortadinhos pequeninos, isso pode estar ligado a uma questão de mastigação e isso precisa ser trabalhado. Quando não conseguem comer carnes muito fibrosas, que sejam grelhadas ao invés de cozidas, não conseguem comer essa textura mais difícil, isso é um ponto de atenção” informa a fono Carla Deliberato, que conclui falando sobre a importância de procurar ajuda profissional especializada “é muito importante o fonoaudiólogo considerar que a criança não é uma boca isolada, ela come alimentos e eles tem que estar relacionados com prazer, com desejo de querer comer e não alimentos que são oferecidos de maneira forçada. Então isso tem que relacionar a situação do ambiente, a situação do desejo em querer comer, o prazer, com a habilidade motora oral relacionada especificamente com a mastigação.”
Sobre Carla Deliberato:
Carla Deliberato é fonoaudióloga formada pela PUC-SP desde 2003, com vasta experiência em atendimento clínico, hospitalar e domiciliar de pacientes com dificuldades alimentares (disfagia, recusa alimentar e seletividade alimentar), sequelas neurológicas e oncológicas do câncer de cabeça e pescoço, síndromes, além de atuação em comunicação alternativa e voz.
Tem passagem pelo Instituto do Desenvolvimento Infantil, Clínica Sainte Marie, Hospital Israelita Albert Einstein, Associação de Valorização e Promoção do Excepcional (AVAPE), Associação para Deficientes da Áudio-Visão (ADefAV), Unidade de Vivência e Terapia (UVT), entre outras instituições.
Passou a entender e atuar com recusa e seletividade alimentar por conta da maternidade, quando descobriu que a segunda filha, a Isabela, tinha resistência aos alimentos, além de sofrer com náuseas recorrentes durante o processo de introdução alimentar.