câncer de estômago

O câncer de estômago em indivíduos com menos de 50 anos pode estar relacionado a uma mutação genética hereditária

Uma das síndromes mais comuns nesses casos é a síndrome do câncer gástrico difuso hereditário, que está associada a uma alteração no gene CDH1. Quando essa mutação é confirmada por meio de testes genéticos, é recomendada a redução do risco por meio da remoção preventiva de órgãos e/ou exames frequentes de rastreamento.

A notícia da morte da ex-jogadora da seleção brasileira feminina de vôlei, Ana Paula Borgo, aos 29 anos, em decorrência de câncer de estômago, chama a atenção para a ocorrência de tumores gástricos em jovens. Normalmente, o câncer de estômago é mais comum entre os 55 e 80 anos, principalmente entre os 60 e 70 anos, sendo raro antes dos 50 anos. No entanto, de acordo com o National Comprehensive Cancer Network (NCCN), mesmo sem histórico pessoal ou familiar prévio, a ocorrência de um caso de câncer gástrico antes dos 50 anos é um critério que indica a realização de testes genéticos e aconselhamento genético.

Estima-se que o câncer de estômago seja o quarto tipo mais comum em homens e o sexto mais comum em mulheres, com 21.480 novos casos previstos para 2023, de acordo com dados do Instituto Nacional de Câncer (INCA). Globalmente, a Agência Internacional para Pesquisa do Câncer da Organização Mundial da Saúde (IARC/OMS) registrou mais de 1 milhão de novos casos em 2020, tornando-o o quinto câncer mais comum.

Um dado preocupante é a alta taxa de diagnóstico tardio. Sete em cada dez casos são descobertos em estágios avançados da doença. O estadiamento, que determina o estágio em que a doença é diagnosticada, mostra que a taxa de sobrevivência de cinco anos cai de 74,7% quando o tumor está restrito ao estômago para 6,6% quando ocorre metástase para outros órgãos. Em 2020, houve 768 mil mortes relacionadas ao câncer de estômago em todo o mundo, incluindo 13 mil no Brasil.

Para reverter esse cenário, têm ocorrido avanços promissores no tratamento, segundo o cirurgião oncológico Héber Salvador, presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO). Esses avanços incluem a padronização do tratamento cirúrgico com a remoção dos linfonodos mais propensos a serem afetados, cirurgias minimamente invasivas e uma melhor compreensão dos aspectos moleculares que permitem uma indicação mais precisa de quimioterapia antes e após a cirurgia. A imunoterapia também tem mostrado evidências de uso, embora em um número reduzido de pacientes.

Embora a maioria dos casos de câncer gástrico seja considerada esporádica e relacionada a fatores ambientais, como tabagismo, consumo de álcool e alimentação rica em sódio, estima-se que 5% a 10% dos casos tenham uma componente familiar e 3% a 5% estejam associados a síndromes hereditárias de predisposição ao câncer.

Uma das síndromes hereditárias relacionadas a um maior risco de câncer gástrico é a síndrome do câncer gástrico difuso hereditário. Essa síndrome é autossômica dominante e é caracterizada pelo desenvolvimento de cânceres gástricos difusos, predominantemente do tipo células em anel de sinete, em uma idade jovem. A síndrome está principalmente associada a mutações truncadas no gene CDH1, que codifica a proteína E-caderina. Essas mutações são encontradas em 30% a 50% dos casos.

No caso de uma pessoa com essa mutação, o risco de desenvolver câncer gástrico antes dos 80 anos é de 67% para homens e 83% para mulheres, e a idade média de diagnóstico do câncer gástrico nessas pessoas é de 37 anos. Além disso, mulheres com mutações no gene CDH1 têm um risco aumentado de desenvolver carcinoma lobular da mama. Nessas situações, é recomendado encaminhar os pacientes para um centro especializado com uma equipe multidisciplinar que inclua cirurgião especializado em câncer gastrointestinal, gastroenterologista, especialista em genética clínica, nutricionista e conselheiro ou psiquiatra, de acordo com as recomendações do NCCN.

Outras síndromes hereditárias de predisposição ao câncer também podem aumentar o risco de câncer gástrico. Por exemplo, indivíduos com síndrome de Lynch, causada por mutações nos genes EPCAM, MLH1, MSH2, MSH6 ou PMS2, têm um risco de 1% a 13% de desenvolver câncer gástrico, com maior incidência na população asiática. Além disso, a síndrome de Li-Fraumeni e a síndrome de polipose juvenil (JPS) também estão associadas a um risco aumentado de câncer gástrico, entre outras condições.

No entanto, não há evidências suficientes para o rastreamento de síndromes de câncer hereditário relacionadas ao câncer gástrico. As diretrizes do NCCN oferecem recomendações para o rastreamento e acompanhamento de pessoas com mutações no gene CDH1, como a gastrectomia total profilática entre 18 e 40 anos de idade e a realização de endoscopia digestiva alta antes da cirurgia. Para aqueles que optam por não se submeter à gastrectomia profilática, é recomendada uma triagem regular por endoscopia digestiva alta com múltiplas biópsias aleatórias a cada 6 a 12 meses. Mulheres com mutações no CDH1 também devem ser acompanhadas de acordo com as diretrizes de alto risco para câncer de mama.

É importante ressaltar que o aconselhamento genético e o acompanhamento médico são essenciais para indivíduos com histórico familiar de câncer gástrico ou que apresentem critérios de risco para síndromes hereditárias. Ao identificar uma mutação genética causadora de câncer em uma família, é recomendado testar parentes próximos afetados pela doença ou que possuam graus de parentesco mais próximos, como pais, irmãos e filhos, para determinar se eles também são portadores da mutação.

O diagnóstico precoce desempenha um papel fundamental na melhoria do prognóstico do câncer gástrico. Infelizmente, a taxa de diagnóstico tardio é alta, com sete em cada dez casos sendo descobertos em estágios avançados da doença. Quanto mais avançado o estágio no momento do diagnóstico, menor a chance de cura. Portanto, é crucial aumentar a conscientização sobre os fatores de risco, realizar exames de rastreamento adequados e buscar atendimento médico diante de sintomas suspeitos, como dor abdominal persistente, perda de peso inexplicada, dificuldade na digestão e presença de sangue nas fezes.

Em termos de avanços no tratamento do câncer gástrico, houve progressos significativos na padronização dos procedimentos cirúrgicos, com a remoção estratégica dos gânglios linfáticos mais propensos a serem afetados. Além disso, técnicas de cirurgia minimamente invasiva têm sido utilizadas, resultando em recuperação mais rápida e menos complicações pós-operatórias. O entendimento dos aspectos moleculares do câncer gástrico também permitiu uma melhor seleção de pacientes para quimioterapia antes e após a cirurgia, com base em características específicas do tumor.

Além disso, há evidências promissoras sobre o uso da imunoterapia no tratamento do câncer gástrico, embora ainda seja aplicada em um número limitado de pacientes. A imunoterapia tem mostrado resultados encorajadores no fortalecimento do sistema imunológico para combater as células cancerígenas, melhorando a sobrevida e a qualidade de vida dos pacientes.

Em resumo, o câncer gástrico em jovens, especialmente antes dos 50 anos, pode estar associado a mutações genéticas hereditárias. Diante desse cenário, é fundamental investigar casos de câncer gástrico precoce e realizar testes genéticos para identificar possíveis mutações. O aconselhamento genético e o acompanhamento médico especializado desempenham um papel crucial na prevenção, detecção precoce e tratamento adequado desses casos. A conscientização sobre os fatores de risco, o acesso a exames de rastreamento e o avanço nas opções terapêuticas são fundamentais para melhorar o prognóstico e a qualidade de vida dos pacientes com câncer gástrico.

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